Vivemos um dos momentos globais mais difíceis dos últimos 100 anos. O avanço da pandemia traz grandes desafios, ao tempo em que inspira o melhor de nós. É hora de união.
Uma onda de solidariedade tem se espalhado e as empresas brasileiras em condições, não ficariam de fora desse movimento.
O Banco Itaú anunciou a iniciativa “Todos pela Saúde”, prometendo o repasse vultoso da quantia de R$ 1 bilhão (um bilhão de reais). A Vale, a Petrobras, a Rede D’Or, a Gerdau, o Santander, o Bradesco, e muitas outras empresas começam a fazer doações.
A Cervejaria Ambev alterou sua linha de produção para produzir álcool em gel 70% e, em seguida, distribuiu gratuitamente a hospitais necessitados do produto.
Além de ser um ato de solidariedade e altruísmo, doar também reforça a percepção positiva da sociedade sobre a empresa e demonstra que esta cumpre a sua função social. Afinal, gera emprego, renda, desenvolvimento local e quando pode, também contribui com a comunidade por meio da filantropia.
As doações são variadas, incluem-se valores em dinheiro, equipamentos, máscaras, alimentos, produtos de higiene pessoal, ou até mesmo serviços direcionados ao combate da pandemia.
Contudo, um aspecto relevante tem passado despercebido por muitas empresas. A possibilidade de obter a isenção do ICMS quando a mercadoria for doada.
Sabemos que no contexto da recessão econômica instaurada, é muito importante que aqueles que estão no comando das empresas busquem a redução da carga tributária incidente sobre sua atividade. Trata-se de estratégia empresarial relevante, que visa garantir a continuidade da própria atividade empresarial.
Para aquelas empresas que comercializam produtos ou mercadorias, sejam elas fabricantes, atacadistas ou varejistas, incide nestas operações o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias (ICMS). Este tributo é a principal fonte de recursos dos estados, e representa o maior peso no bolso destes contribuintes.
Conforme a legislação vigente, quando estas empresas doam produtos em estoque, em regra, terão que pagar o ICMS. Isto porque o fato gerador do imposto ocorre na saída da mercadoria do estabelecimento, a qualquer título, não levando em consideração o motivo da respectiva saída. Logo, até mesmo as doações de produtos são consideradas saídas comuns para fins de tributação do ICMS.
Assim, mesmo não havendo um pagamento em dinheiro ou contraprestação pecuniária, a saída de mercadoria em doação atrai a incidência do ICMS. Por essa regra, a empresa que efetua a doação deverá emitir a correspondente nota fiscal no ato da saída das mercadorias doadas, e recolher o imposto.
Como obter a isenção do ICMS
Mas nem sempre o ICMS irá incidir na operação de doação. Há um caminho para que seja reconhecida a isenção em favor destas empresas, uma forma para que o empresário altruísta possa evitar essa tributação indesejada, muitas vezes burocrática, e por vezes desconsiderada pelo setor contábil.
Trata-se de uma previsão normativa constante no antigo Convênio ICM 26/75, atualmente vigente por força do Convênio ICMS 151/94. Essa regra foi reproduzida aqui no Estado do Maranhão, no Anexo 1.1 do Regulamento do ICMS (incisos III e IV, do art. 1º).
Nesse contexto, somente haverá isenção do ICMS nos casos em que as doações sejam destinadas a entidades governamentais, para assistência a vítimas de calamidade pública, assim declarado por ato expresso da autoridade competente, ou para entidades assistenciais reconhecidas de utilidade pública, que atenda aos requisitos previstos no art. 14 do Código Tributário Nacional.
Nas doações realizadas a estas entidades, ficará ainda assegurada a manutenção do crédito do ICMS. Além disso, também há desoneração do imposto na prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal das mercadorias doadas.
Para quem eu posso doar?
Nesse sentido, veja que o principal detalhe no ato de doação de mercadorias para fins de reconhecimento da isenção fiscal, consiste em escolher corretamente a entidade filantrópica a ser beneficiada.
Para o Governo, as doações deverão ser realizadas a entidades governamentais (órgãos públicos) que assistem as vítimas da calamidade pública. A empresa deverá manifestar o interesse formalmente, ou se submeter a um procedimento administrativo de chamamento público. A doação é celebrada por meio de termo de doação.
Já as doações realizadas para a iniciativa privada, para auferirem o direito de isenção de ICMS, deverão ser destinadas a entidades assistenciais reconhecidas de ‘utilidade pública’. No âmbito do município de São Luís/MA, a lei n. 3514 de 04 de julho de 1996, estabelece os critérios para a declaração de utilidade pública, e cita em seu anexo relação de entidades portadoras do título de utilidade pública.
Estas últimas, ainda terão que cumprir os requisitos previstos no art. 14 do Código Tributário Nacional: não distribuir qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título, bem como aplicar integralmente, no país, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais e, por fim, manter escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.
Por isso, para as empresas se valerem desse benefício de isenção de ICMS, inclusive com manutenção dos créditos correspondentes, a recomendação é que identifiquem se a entidade filantrópica donatária é reconhecida como de utilidade pública, por meio de cópias dos documentos e atos legais que comprovem essa condição. Após a doação, tais documentos deverão ser arquivados, para comprovação junto às autoridades fazendárias.
Podemos perceber, então, que a isenção de ICMS é limitada a determinadas entidades donatárias.
É preciso ampliar e desburocratizar a doação em tempos de covid-19
A principal crítica, ainda mais nestes momentos de combate ao Covid-19 e de grave crise econômica, é que essa desoneração deveria ser ampla e irrestrita, alargada para qualquer instituição, sem todos esses requisitos e critérios para afastar essa indesejada tributação.
Assim, bastaria que a isenção do ICMS fosse revista em novo Convênio pelo Conselho Nacional de Política Fazendária, bem como também no âmbito da competência dos Estados, principalmente quanto à exigência de título de utilidade pública à entidade donatária do produto. Sugestão equiparada à extinção do título de Utilidade Pública Federal (UPF), levada à cabo pela lei n. 13.204/15, como resultado de um conjunto de medidas de desburocratização das relações do Estado com as Organizações da Sociedade Civil.
Se você é empresário e deseja instituir uma política de doações na sua empresa atente-se às informações acima citadas, de modo que não seja onerado com o recolhimento do ICMS. Além disso, clique aqui para conhecer as 10 medidas essenciais para garantir um procedimento hígido de doação.
O objetivo deste texto foi analisar a tributação ou isenção nas operações de doação de mercadoria apenas em relação ao ICMS. O tema doações e o direito tributário também desperta implicações em relação a outros tributos, tais como IRPJ, IRPF, CSLL, IPI, ITCMD, PIS e COFINS, entre outros.