15 jun 2020

O Poder Público pode desapropriar o seu imóvel!

O Poder Público pode desapropriar imóvel pertencente ao particular, com a finalidade de utilidade pública ou interesse social, sob o argumento de ser interesse coletivo.

Um exemplo corriqueiro é quando há a necessidade de construção de rodovia no perímetro em que se encontra um imóvel particular. Nesse caso, a Administração “toma para si o bem”e constrói a rodovia em prol do interesse da coletividade.

Também chamada de expropriação, a desapropriação é a transferência obrigatória da propriedade particular para a Administração Pública, e pressupõe o pagamento prévio de justa indenização ao proprietário ou ao titular do domínio do bem imóvel.

Ou seja, em tese, o Poder Público só pode “tomar”a sua propriedade privada se pagar um preço justo por ela.   

Em regra, o preço é ofertado judicialmente, cabendo ao juiz fixar o valor final da indenização após produção de provas, conforme artigos 13 e 24 do Decreto-lei 3.365/41. 

É comum que o Estado não realize o pagamento prévio de indenização justa. O que fazer?

Contudo, infelizmente, a ineficiência da gestão pública, ou mesmo a falta de suficientes recursos orçamentários são causas para o Poder Público se apossar de áreas particulares sob a justificativa da construção de obras públicas, sem a devida indenização ao particular prejudicado. Lamentavelmente, não são raras as vezes que estas situações acontecem.  

Chama-se de desapropriação ‘indireta’ porque a expropriação acontece, mas sem o pagamento prévio de indenização justa.  

Tamanha é a ilegalidade deste apossamento administrativo, que muitos defendem se tratar de ‘esbulho possessório’, que daria azo ao proprietário, inclusive, valer-se de desforço físico ou emprego de força policial para se manter em sua propriedade, ou mesmo de ação possessória, até que receba a indenização devida.  

Contudo, muitas vezes essa oposição imediata pelo proprietário não se mostra viável, já que o Poder Público, tão logo se apossa do imóvel, inicia a execução das obras, fazendo com que a permanência no local seja impraticável.

Assim, o particular se ausenta do imóvel sob a promessa de que receberá a indenização, o que não ocorre, e o imóvel já se torna de domínio público.     

Nestes casos de evidente abuso do Poder Público, o próprio proprietário deverá ingressar com ação judicial, o que se convencionou chamar de ação de desapropriação indireta. Na qual a Administração Pública será obrigada a indenizar o proprietário pelo preço justo do imóvel.  

Qual o prazo para o ajuizamento da ação?

Qual o prazo, então, para que o particular prejudicado pelo apossamento administrativo demande em juízo a indenização justa pelo seu imóvel? Sabe-se, afinal, que para todo direito violado nasce a pretensão de reparação pelo titular desse direito, que deve ser exercida dentre do prazo de prescrição.  

Contudo, a legislação não previu o prazo prescricional para a desapropriação indiretaAssim, diante da lacuna do ordenamento jurídico, tecnicamente, o Superior Tribunal de Justiça – STJ, utilizando-se da interpretação por analogia, fixou a tese de que a referida ação possui natureza real e, enquanto não transcorrido o prazo para aquisição da propriedade por usucapião, permaneceria a pretensão de reivindicar o preço correspondente pelo bem imóvel objeto do apossamento administrativo. 

Nesse sentido, conquanto as hipóteses legais de desapropriação por utilidade pública indicam que o apossamento administrativo teria por fim a realização de obras ou serviços de caráter produtivo, o STJ compreendeu pela aplicação da regra especial do parágrafo único do art. 1.238 do Código Civil de 2002, que estabelece o prazo prescricional de 10 anos.  

Tese do STJ: o prazo para ajuizamento da ação é de 10 anos.

Em resumo, a tese fixada pelo STJ foi a seguinte:    

O prazo prescricional aplicável à desapropriação indireta, na hipótese em que o Poder Público tenha realizado obras no local ou atribuído natureza de utilidade pública ou de interesse social aimóvel, é de 10 anos, conforme parágrafo único do art. 1.238 do CC. 

Na prática, nos casos em que o Poder Público realiza obras no local ou tenha atribuído ao imóvel utilidade pública ou interesse social, sem o pagamento do preço correspondente ao bem, terá o particular o prazo de 10 anos para requerer judicialmente a justa indenização pelo imóvel. 

Após este prazo, o interessado perderá qualquer possibilidade de recebimento dos valores indenizatórios. Perderá, para sempre, o imóvel e o direito à indenização.   

O prazo parece longo. Porém, o que temos visto é que muitos proprietários vítimas de desapropriação indireta tentam por anos receber suas indenizações na via administrativa, por meio de requerimentos dirigidos ao próprio Ente Público infrator. E após a abertura de procedimento administrativo, por vez com a promessa de pagamento pelos gestores públicos, o requerente tem a ilusão de que seu pleito será atendido. E invariavelmente, o prazo de 10 (dez) anos escoa pelo ralo.  

Sendo assim, se você teve imóvel expropriado pelo Poder Público e já está há anos em “via crucis”administrativa, atente-se ao prazo prescricional para não ver o seu direito impedido de ser exercido. Se até o momento, a Administração ainda não indenizou-lhe na integralidade é muito provável que não faça espontaneamente. Assim, o caminho para reaver o numerário seu por direito é a provocação do Poder Judiciário.


Referência 

REsp 1.757.352-SC, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por maioria, julgado em 12/02/2020, DJe 07/05/2020Tema 1019. Informativo da Jurisprudência de nº 671